domingo, 9 de dezembro de 2007

Falhos Soldados



Falhos soldados esquecidos tropeçam na estrada. O coração chora, a alma devora qualquer vontade de existir... Eles arrastam suas armas sem munição, a bandeira rota limpa o sangue do homem tétrico que sussurra seu perjúrio para as árvores, e os jovens, fatigados das batalhas, choram por seus amores exilados. Ah! Cede a luz que oscila na névoa, um repouso, um refúgio, uma fuga da marca no peito: uma ferida aberta que explora o coração, uma visão, um templo sagrado onde possam se curar as feridas e sejam apagados os rostos deixados para traz. Que o caminho oprime os envelhecidos da guerra. Os corações que se perderam no tempo do cárcere e não chegam mais a se arriscar na tempestade colorida das armas de fogo.
Vento sopra medo, fica quieta a canção da vitória no porvir, apenas cega o futuro, rasga a farda e abandona a espada, não há mais pelo o que lutar.
Ah... pede um drink no bar, brinda o cavaleiro das sombras. Corrói os corpos e deixa sobre a mesa, o coração de quem morreu pelo menor preço. Os que foram caros, os coloca nos bolsos, e os leiloa logo mais.
Sujas faces, nada limpa tão profunda insatisfação, e como dói o compasso do tempo, nada em que se acreditar para seguir agora.
Uma bala no peito, um rasgo nas entranhas, e tudo esta devastado. Não existem pássaros que cantem o choro, todos se calam, se fecham, gritam com seus olhos o desespero. Ameaça uma lágrima que não cai, duas lágrimas que não caem, mas a cada metro, outro soldado cai, permanece e se apaga, sem rosto, sem amores, apenas a marca de seu ferimento, fratura exposta na história. Eles seguem, vegetam, padecem e somem na névoa quando se apaga a luz.

Sem Reflexo


Uma negra borboleta pousou em meus ombros, deixei que ela me levasse pela dança de suas asas. Ressurgindo pela morte, e não dela. Sem escolha ou força, deixei a cabeça tombar em direção ao peito. Agora os olhos se erguem e após o funeral eu serei a essência dela e ela meu coração.
Nos meus lábios um único gosto, um estigma em minha pele, cicatriz eterna. Tento conter o sangue toda noite, mas a cicatriz ressurge ao amanhecer.
O rubor desaparece. Pálida, não me olhe assim, não me julgue ou me venere.
Esta fera grita, somos espetáculo de Quixote. Adormeço como Bela-Adormecida, meu sono não tem nada de belo, é apenas profundo e denso.
Neste cruel pesadelo
Faz-me bizarro com teu veneno
Cria seu filho em meu ventre
Adormece-me com teu zelo
Pinta meus olhos de negro
Camufla a pele com essas vestes
Está frio lá fora
Também não há pinturas, os desenhos sobre sua mesa estão espalhados e apodrecendo. A poeira tira o brilho do verniz recente da madeira velha. As portas rangem, os galhos batem nas janelas, as árvores ancestrais quase cobrem a visão da igreja, do pequenino mosteiro sobre a colina e do cemitério atrás dos framboeseiras.
As casas amontoam-se e rejubilam nos interiores chamas alaranjadas como grandes flores. O ar tem vários cheiros, o café do bar decadente na entrada desse prédio velho, o vinho aberto sobre a mesinha ao centro da sala, quase posso jurar que este novo cheiro delicado, suave, “úmido”, de uma doçura quase acida e refrescante seja o cheiro do sereno.
Sinto as costas rasgarem de dentro para fora, onde esta sua mão para segurar a minha? Você demora da caçada, eu volto a regurgitar o sangue. Sinto muito frio. Estigma cada vez mais aparente em minha pele. Asas de borboleta. Estou com frio.
Sem orgulho rastejo, entra a essência da borboleta pelas minhas veias, o vestido branco enegrece, sinto o sangue escorrendo em minhas costas, agarro-me no grosso batente da janela, tudo aqui é desumano, turvo, embriagador, céptico, assustador, hediondo, sujo, velho, decrépito, belo.
Uma grande sombra me cobre. E não há reflexo meu no espelho...Onde esta você para segurar minha mão, estacar meu sangue, e me segurar com seus braços fortes?
Sombra negra. Grandes asas surgem e tampam a lua. Torno-me vagarosamente esta borboleta enquanto a dor me trucida. E, estas grandes asas que tampam a visão para a cidade, eu sei, você ira chegar.
Neste cruel pesadelo
Faz-me bizarro com teu veneno
Cria seu filho em meu ventre
Adormece-me com teu zelo
Pinta meus olhos de negro
Camufla a pele com essas vestes
Está frio lá fora.